SEM NOME
Uma hora antes do início do concerto já uma senhora esperava, sentada confortavelmente na primeira fila.
Quando nos viu (a mim e à Gali) de máquinas fotográficas na mão, pensou que fossemos da televisão, essa gente sem vergonha e sem honra, verdadeiramente capaz de tudo.
Insistimos que não, mas quem vive na rua tem que ser desconfiado, para garantir a sobrevivência. Durante todo o tempo que ali estivemos ela desconfiou que fossemos da televisão e ao menor movimento da máquina chamou-nos atrevidas, enquanto ameaçava delicadamente bater-nos com o chapéu-de-chuva.
Sentei-me ao seu lado para lhe mostrar as fotografias, numa vã tentativa de demonstrar que não estávamos ali para lhe fazer mal. Não viu nenhuma.
O brilho que saía do LCD era demasiado forte para os seus delicados e profundíssimos olhos azuis.
Preferiu conversar. Foi por isso que me contou a história do bandalho que a persegue com ameaças de morte, depois de lhe ter partido uma garrafa na cabeça.
Perguntei-lhe se tinha feito queixa dele. Respondeu-me que sim, e por isso estava preso.
Então de que tem medo? perguntei-lhe eu num tom que dava por certo não poderem existir outros motivos para medos. É que ele há-de sair… retorquiu ela, fazendo-o de maneira a que eu me sentisse a pessoa mais ignorante do planeta.
Até me chamou nomes…chamou-me vaca, e eu disse-lhe: se eu sou vaca, tu és touro….
Admirei-me. Touro???? Ele é mas é um BOI! Nessa altura, ela riu com verdadeiro gosto, nem sei por quanto tempo, mas muito. E ia repetindo...um Boi!! Essa é muito boa.
Durante o concerto, enquanto João Paulo e Dennis Gonzalez ofereciam um espetáculo de altíssima qualidade, perguntou-me várias vezes quando é que aquilo acabava, que queria ir dormir. - Não está a gostar? E tão bonito. Bah, é tudo igual! Já estou com sono, respondeu-me.
Isto passou-se no Sábado em Torres Vedras, e o cheiro dela ainda não me largou.
A dada altura pensei que seria assim se vivesse na rua. Meio enlouquecida mas sempre de cabeça erguida. Calei o pensamento quando dei por mim a deambular pelas ruas, com um cobertor e um guarda-chuva - e uns brincos a condizer com o chapéu.
No final da noite, já de regresso a Lisboa, o PC disse-me convicto: tu serias como aquela senhora se vivesses na rua. - Como ela… o que queres dizer com isso?? - Assim meio doida, mas com muita garra…
Agora sou eu que acho tudo igual e quero ir dormir. Não me sai da cabeça que não lhe perguntei o nome…
(Fotos de Devaneante)
5 Comentários:
Com garra e sempre pronta para uma boa gargalhada, já para não falar numa boa garfada ?!?!
Gali
Ah, ah, ah, essa da garfada está mesmo bem metida, Gali, eh, eh, eh...
E as serpentes, já te visitaram, filha ?
Rais o partisse !
Beijos para as meninas,
PC
Gali,
Uma ou duas boas garfadas, levam geralmente a algumas gargalhadas. Não há melhor! ;-))
PC,
As serpentes eram só com ele. Comigo era mais pérolas...
E para que é que interessa o nome? Obrigada pela boleia. :)
Skinstorm,
É como se não me importasse a sua identidade. Talvez ela tivesse gostado que assim não fosse.
Sempre às ordens. :-)
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